O trágico destino de uma vila que se tornou um símbolo poderoso de esperança
Amanhecia no bucólico vilarejo de Lídice, a 17 km de Praga, atual República Tcheca. Era 10 de junho de 1942. Um novo dia na história de mais de quinhentos anos! Mas foi o seu último e doloroso dia. O dia da vingança de Hitler pelo assassinato do Reinhard Heydrich, o governante alemão na região, executado por um comando tcheco. Cercada por tropas nazistas, 173 homens acima de 15 anos foram trancados num barracão, enquanto as mulheres e crianças eram enviadas para uma localidade próxima. Retirados do barracão em grupos de 10, os homens foram sumariamente fuzilados.
Toda Lídice foi completamente destruída
Três dias depois, as mulheres foram separadas de seus filhos, e enviadas para o campo de concentração de Ravensbrück, na Alemanha. As crianças que se adaptaram aos padrões nazistas de germanização, foram adotadas por oficiais alemães. As demais 82 crianças foram enviadas para o campo concentração de Chelmno, na Polônia e, ali, mortas. Não bastasse isso, as mais de 50 casas, escola e igreja em estilo barroco, tudo foi queimado e destruído com explosivos. O cemitério foi violado, e todos os escombros do vilarejo, nivelados, para apagar do mapa a pequena Lídice.
Terminada a guerra, em 10 de junho de 1945, terceiro aniversário do massacre, mais de 150 mil pessoas reuniram-se numa cerimônia no antigo terreno de Lídice. 143 mulheres e 17 crianças sobreviventes estavam lá – mães clamavam por seus filhos desaparecidos. Talvez ainda estivessem vivos, em algum lugar! “Ajudem-nos a encontrar nossos filhos. Sem eles, a vida não é vida”.
A tragédia tem comovido gerações. Tema de filmes, de campanhas solidárias. O nome “Lídice” foi dado a meninas recém-nascidas, bem como a cidades e bairros mundo afora.
O legado de Uchytilová
Marie Uchytilová Kucová tinha 18 anos quando Lídice foi destruída, não muito distante de onde morava. Formada em Escultura, a partir de 1969, ela alimentou o sonho de representar as 82 crianças executadas em Chelmno. Não apenas para as crianças de Lídice, um monumento para as 13 milhões de crianças vítimas da segunda guerra mundial: “Eu estou criando este Monumento com a ideia de que o rebanho indefeso, abandonado e ansiosamente unido de crianças estará em uma planície gramada de Lídice para se tornar uma voz jamais calada de milhões de mortos…”
Uchytilova visitou as mães sobreviventes, procurando obter informações tais como altura, temperamento e idade das crianças, além de possíveis fotos que as retratassem. Para não provocar ainda mais dor nas mães, ela procurou não representar as crianças exatamente como elas eram.
A escultora fez os 82 moldes em gesso, representando 42 meninas e 40 meninos. Somente após sua morte, em 1989, foram criadas as fundições em bronze, com a ajuda de seu marido. As primeiras 30 estátuas foram instaladas no Memorial em 1995, e as últimas em 10 de junho 2000.
Dispostas num ângulo de 180 graus, de uma tristeza comovente, os olhares das estátuas contemplam o local onde viveram com seus entes queridos e que, hoje, é apenas um campo vazio, a sepultura de seus pais e irmãos. Qualquer pessoa que olhe para o monumento dentro desse ângulo, sente-se observada por pelo menos uma das crianças. Embora estátuas, parecem estar em movimento, enquanto seguram as mãos, apoiam-se umas às outras.
O propósito de Uchytilova se cumpriu. As estátuas não estão caladas. Elas denunciam a loucura daqueles que teimam em fazer história à custa das vidas inocentes. Mas não só. Elas também testemunham o quanto a boa vontade de um simples ser humano pode fazer para tornar o mundo um lugar mais decente para viver.
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